O dólar inverteu o sinal e passou a subir nesta quinta-feira (19), alcançando o patamar dos R$ 6,29 por volta das 9h40, com investidores ainda atentos ao cenário fiscal brasileiro e repercutindo o Relatório Trimestral de Inflação divulgado pelo Banco Central do Brasil (BC) nesta manhã.
A alta acontece mesmo após o BC promover um novo leilão de venda de dólar à vista nos primeiros minutos do pregão, com o objetivo de conter o avanço expressivo da taxa de câmbio.
O foco do mercado segue no cenário fiscal. Nesta quarta-feira, relator de um dos projetos do pacote de corte de gastos do governo federal na Câmara dos Deputados apresentaram seus pareceres para que os textos sejam votados na Casa.
O problema é que houve uma "desidratação" de algumas medidas — ou seja, amenizou alguns pontos no texto que podem resultar em uma contenção das despesas públicas menor que o esperado. (veja mais detalhes sobre esse ponto mais abaixo)
Investidores acompanham de perto o desenrolar das propostas que compõem o pacote de corte de gastos e há um temor de que as medidas anunciadas não sejam suficientes para equilibrar as contas públicas e conter o avanço das despesas do governo.
Há expectativas de que mais medidas do pacote sejam votadas nesta quinta.
Além do cenário fiscal, o mercado repercute, também, o relatório de inflação do BC. A instituição admitiu oficialmente que a meta de inflação, em 2024, será descumprida novamente, pelo terceiro ano seguido.
A meta para 2024 era de 3,0% e poderia oscilar entre 1,50% e 4,50% para ser considerada formalmente cumprida.
Veja abaixo o resumo dos mercados.
Dólar
Às 09h45, o dólar subia 0,37%, cotado a R$ 6,2903. Na máxima do dia, chegou a R$ 6,3206.
Na véspera, a moeda norte-americana subiu 2,82%, cotada a R$ 6,2672.
Com o resultado, acumulou:
- ganhos de 3,85% na semana;
- alta de 4,44% no mês;
- avanço de 29,15% no ano.
O Ibovespa começa a operar às 10h.
Na véspera, o índice caiu 3,15%, aos 120.772 pontos.
Com o resultado, acumulou:
- queda de 3,08% na semana;
- perda de 3,90% no mês;
- recuo de 10% no ano.
O que está mexendo com os mercados?
O pacote de corte de gastos proposto pelo governo federal continua andando no Congresso. A ideia é economizar R$ 70 bilhões nos próximos dois anos, e um total de R$ 375 bilhões até 2030.
O relator de um dos projetos do pacote de corte de gastos enviado pelo governo, deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), apresentou nesta quarta-feira (18) seu parecer e manteve o limite proposto pelo governo na alta do salário mínimo. A proposta seria votada na noite desta quarta, mas, por risco de falta de quórum, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), passou a votação para a manhã da quinta.
Em seu parecer, o relator também amenizou regras inicialmente previstas pelos governo na concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e excluiu mudanças no reajuste do Fundo Constitucional do Distrito Federal (leia mais abaixo). Na prática, as mudanças desidrataram o texto enviado pelo governo e vão afetar o efeito do corte.
Na terça-feira, as primeiras medidas foram aprovadas pelos parlamentares: a Câmara dos Deputados aprovou o texto que proíbe a ampliação de benefícios tributários quando as contas públicas tiverem um desempenho negativo.
Além disso, quando o governo registrar déficit primário (situação em que as despesas são maiores que o dinheiro arrecadado), a proposta aprovada ativa um "gatilho" que limita o aumento de gastos do governo com pessoal.
O governo precisa reduzir os gastos porque tem uma meta de zerar o déficit público pelos próximos dois anos — ou seja, gastar o mesmo tanto que arrecada em 2024 e 2025. O arcabouço também estipula que o governo deve começar a arrecadar mais do que gasta a partir de 2026, para controlar o endividamento público.
Mas os agentes financeiros já não esperam grande eficácia das medidas para controlar o endividamento público, e declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Fantástico consolidaram a percepção de que o governo não pretende avançar muito na contenção de despesas.
O mercado tinha a expectativa de que o governo mexesse em gastos estruturais nesse pacote de corte de gastos — como a Previdência, benefícios reajustados pelo salário mínimo e os pisos de investimento em saúde e educação. Mas isso não aconteceu.
Segundo os analistas, essas despesas tendem a subir em velocidade acelerada e têm potencial de anular esse esforço do pacote em pouco tempo. O governo, contudo, é avesso às medidas, que mexeriam com políticas públicas e com promessas de campanha do presidente Lula.
Segundo o blog do Valdo Cruz, interlocutores do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, avaliam que o governo precisa dar uma sinalização mais forte na área fiscal, incluindo o anúncio de medidas adicionais às já anunciadas, para reverter de vez o cenário negativo que reina no mercado neste fim de ano.
Os aliados de Haddad acreditam que a aprovação do pacote já enviado ao Congresso vai ajudar a acalmar os ânimos dos investidores, mas as medidas não serão suficientes para derrubar o dólar.
Reflexos da decisão do Fed
Os mercados interno e externo ainda repercutem o resultado da reunião do Fed, nesta quarta, que decidiu cortar os juros do país em 0,25 ponto percentual, para a faixa de 4,25% a 4,50% ao ano. A decisão veio em linha com as expectativas, mas não foi unânime.
Esse foi o terceiro corte seguido da taxa. Na reunião de novembro, o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) reduziu o referencial na mesma proporção, em 0,25 p.p., enquanto na reunião de setembro o corte foi de 0,50 ponto.
Em nota, o Fomc afirma que os indicadores econômicos dos EUA sugerem que a atividade econômica do país continuou a se expandir em ritmo sólido, mas com os riscos controlados.
"Desde o início do ano, as condições do mercado de trabalho se suavizaram, e a taxa de desemprego aumentou, mas permanece baixa. A inflação avançou em direção à meta de 2% do Comitê, mas ainda está um pouco elevada", diz o texto.
Essa foi a segunda reunião do Fomc após as eleições presidenciais norte-americanas, que voltaram a colocar o republicano Donald Trump como chefe de Estado da maior economia do mundo.
A nota do Fomc diz ainda que o comitê julga que os riscos para atingir suas metas de emprego e inflação estão aproximadamente equilibrados, mas que as perspectivas econômicas são incertas, e o Comitê está atento aos riscos.
"O Comitê estará preparado para ajustar a postura da política monetária, conforme apropriado, caso surjam riscos que possam impedir o alcance das metas do Comitê", diz.
Diante desse cenário, a leitura é de que a incerteza sobre quais serão os efeitos da gestão de Trump na economia dos Estados Unidos também podem afetar as decisões do Fed à frente.
A eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos já era precificada pelo mercado, mas aumentou as preocupações sobre os efeitos da agenda econômica conservadora e protecionista que o republicano deve carregar durante seu mandato.
Essas medidas são vistas como inflacionárias pelo mercado e podem — além de trazer impactos para a economia de outros países — obrigar o Fed a manter os juros elevados para conter um eventual aumento de preços.
Juros menores nos Estados Unidos podem ser positivos para o Brasil. Isso porque, com taxas menores, os títulos públicos do país (considerados os mais seguros do mundo) passam a entregar uma rentabilidade também menor.
Portal G1