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Líder indígena: garimpo chegou a novas áreas yanomami nos últimos anos

Por Momento Play MT em 22/02/2023 às 08:45:21

Boa Vista (RR), 14/02/2023, O presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye'kuana - Condisi-YY, Júnior Hekurari Yanomami, fala sobre a questão dos indígenas Yanomami no Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami e Yek'uana - DSEI YY. - Rovena Rosa/Agência Brasil

“Um pajé que morava na comunidade de Xitei fugiu por causa da presença dos garimpeiros. Ele não conseguia fazer pajelança. Era muito barulho dos motores. O garimpo ficava a 50 metros [da comunidade]. Como vai conseguir se concentrar e fazer ritual? Ele [chegou a fazer] uma reunião. Algumas comunidades ganharam muitas armas de fogo [dos garimpeiros], como espingardas, pistolas. Essa liderança foi contra e foi embora pra região do Minaú. No Minaú, não tem [garimpo]”, conta Júnior, acrescentando que hoje são poucas as áreas yanomami livres do garimpo.

Um relatório divulgado em abril de 2022, pela Hutukara Associação Yanomami, liderada por Davi Kopenawa Yanomami, e pelo Instituto Socioambiental, organização não governamental (ONG) de defesa dos direitos indígenas, com base em dados coletados no ano anterior, mostrou que 2021 era, até então, o ano de maior destruição provocada pelo garimpo ilegal na região.

“Sabe-se que o problema do garimpo ilegal não é uma novidade na TIY [Terra Indígena Yanomami]. Entretanto, sua escala e intensidade cresceram de maneira impressionante nos últimos cinco anos. Dados do Mapbiomas [ONG de mapeamento do uso do solo] indicam que a partir de 2016, a curva de destruição do garimpo assumiu uma trajetória ascendente e, desde então, tem acumulado taxas cada vez maiores. Nos cálculos da plataforma, de 2016 a 2020 o garimpo na TIY cresceu nada menos que 3.350%”, informa o relatório.

De acordo com o documento da Hutukara, apenas de 2020 para 2021, a destruição provocada pelo garimpo na TIY cresceu 46%. “Esse é o maior crescimento observado desde que iniciamos o nosso monitoramento em 2018, e, possivelmente, a maior taxa anual desde a demarcação da TIY em 1992”, destaca o relatório. “O garimpo não apenas tem crescido em área, mas também tem se espalhado para novas regiões do território yanomami”.

O relatório mostra que entre as áreas com maior incremento do garimpo ilegal nos últimos anos estão Waikás, Homoxi, Kayanau e Xitei. Em Xitei, o crescimento foi de 1.000% de um ano para outro. Algumas áreas não apresentavam nenhum grau de degradação por garimpo em 2020 e passaram a registrar no ano seguinte, como Auaris (no extremo noroeste de Roraima), Parafuri e Waputha.

Um novo levantamento feito pela Hutukara e pelo Instituto Socioambiental mostrou que o garimpo ilegal avançou ainda mais no ano seguinte. Imagens de satélite revelaram crescimento de 54% no desmatamento, provocado pela extração de ouro na Terra Indígena Yanomami de 2021 para 2022.

Radar na Amazônia

De acordo com a Comissão Pró-Yanomami (CCPY), ONG criada na década de 70 para defender essa população indígena, em 1975, o projeto Radar na Amazônia (Radam) descobriu depósitos de minerais como estanho, cobre, níquel, zinco, prata e diamante, além de cassiterita e ouro.

Logo depois, começa um afluxo de garimpeiros à terra indígena, em especial à área de Surucucu, para explorar os depósitos de cassiterita, com o apoio de pistas de pouso que foram abertas por ali.

Ao mesmo tempo, o governo militar começava a implantar seus planos de integração nacional na região, com a abertura de uma rodovia, a Perimetral Norte, e programas de colonização da área por não indígenas. A própria Companhia Vale do Rio Doce, na época uma empresa estatal, também chegou a fazer prospecções nessa terra.

Conflitos com os napëpë

Esse primeiro contato já gerou os primeiros conflitos e problemas para o povo yanomami, uma etnia que vivia relativamente isolada até então (apesar dos primeiros contatos com os napëpë, ou “homem-branco” terem ocorrido na primeira metade do século 20).

Surucucu (RR), 11/02/2023 - GARIMPO: ação coordenada do governo federal no território Yanomami encontra comunidade de povo indígena isolado (Moxihatëtë). Eles vivem a apenas 15 km de um ponto de garimpo. - LEO OTERO/MPI

Segundo a CCPY, o contato dos primeiros garimpeiros provocou a disseminação de doenças venéreas, tuberculose, surtos de gripe e mortes entre os yanomami. As roças dos indígenas também começaram a ser atacadas pelos invasores, em busca de comida.

Em 1980, de acordo com a Comissão Pro-Yanomami, ouro é descoberto na região do Ericó, atraindo mais de 5 mil homens apenas no garimpo de Santa Rosa. O afluxo de garimpeiros à terra yanomami continuou durante toda a década de 80 e culminou no que o Instituto Socioambiental, outra ONG de proteção dos indígenas, chamou de “corrida do ouro”, entre 1987 e 1990.

Isso, apesar de o governo federal decidir interditar parte da terra yanomami para proteger a população indígena, em 1982, e depois criar o Parque Indígena Yanomami, em 1984.

Apesar de uma ação do governo para retirar os garimpeiros, no início da década de 90, a extração ilegal de ouro continuou na área. Em 1993, a ação criminosa de um grupo de invasores resultou na morte de 16 yanomami, na região fronteiriça da Venezuela com o Brasil, no episódio que ficou conhecido como Massacre de Haximu.

Cinco garimpeiros foram condenados por genocídio pelos assassinatos, em 1996, naquela que foi a primeira condenação desse tipo de crime no Brasil.

*Colaborou Ana Graziela Aguiar - Repórter da TV Brasil

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