A violĂȘncia contra mulheres deixa marcas em todo o círculo familiar das vítimas. Quando se trata dos crimes de homicídio, as consequĂȘncias são ainda mais dolorosas, com crianças e adolescentes órfãos e famílias desestruturadas. Um estudo realizado pelo terceiro ano seguido pela Polícia Civil de Mato Grosso, identificou que 42 das 47 mulheres vítimas de feminicídio no ano passado no estado eram mães. Crimes que deixaram 92 filhos e filhas órfãs, sendo que quatro deles também perderam o pai.
A paraense Liliane Barbosa da Silva tinha apenas 27 anos e foi vítima do primeiro feminicídio registrado em 2022 no estado. Ela foi morta pelo ex-companheiro na frente do filho de sete anos, na madrugada do dia 5 de janeiro, em Colíder, no norte de Mato Grosso. Liliane havia solicitado medida protetiva contra o autor do crime, de 23 anos. No mĂȘs anterior, ele chegou a ser preso por descumprir a determinação judicial de se manter afastado da vítima.
No dia do crime, o ex-namorado de Liliane pulou o muro da residĂȘncia onde ela morava com os dois filhos pequenos, arrombou a porta da casa e mandou a vítima ficar em silĂȘncio. Ela chegou a pedir que ele não fizesse nada à filha de quatro anos. O criminoso atacou a vítima com golpes de faca e depois fugiu do local, deixando o filho dela, de sete anos, gritando por ajuda. O autor do crime foi preso em flagrante, horas após o feminicídio.
Os números reunidos no diagnóstico "Mortes Violentas de Mulheres e Meninas em Mato Grosso" mostram que entre as 47 vítimas de feminicídio, 15 delas tinham filhos com os autores dos crimes. O relatório analítico, produzido desde 2020 pela Diretoria de InteligĂȘncia da Polícia Civil, é realizado com base nos dados dos boletins de ocorrĂȘncia e em inquéritos policiais e traz números sobre o local e meio empregado nos homicídios, solicitação de medidas protetivas, perfis das vítimas, vínculo entre vítimas e autores dos crimes e os efeitos da violĂȘncia contra mulheres.
Perfil das vítimas
Do total de 101 mulheres mortas no ano passado, a maioria estava em plena idade produtiva e 62% delas tinham entre 18 e 39 anos. Em relação às vítimas de feminicídio (cometidos por razão de gĂȘnero ou violĂȘncia doméstica), 44% delas foram mortas pelos companheiros ou namorados, 28% tinham ensino fundamental ou médio e 56% eram pardas.
Do total dos crimes, 52% ocorreram no ambiente doméstico, ou seja, nas residĂȘncias das vítimas; outros 22% foram em vias públicas. O principal meio empregado foi a arma de fogo, em 45%, e em 31% dos homicídios foram usadas armas brancas (faca, canivete, facão).
A delegada Mariell Antonini Dias, titular da Delegacia Especializada de Defesa da Mulher de VĂĄrzea Grande, destaca que o estudo ajuda a compreender melhor o fenômeno da violĂȘncia doméstica, deixando claro o risco a que as mulheres estão submetidas quando vivem em situação de violação de direitos em casa e não procuram ajuda da Polícia.
"Muitas mulheres pensam que o agressor não terĂĄ coragem de tirar a vida delas e que as ameaças são vazias. Mas as estatísticas demonstram o contrĂĄrio, pois mais da metade das mortes de mulheres ocorre em casa por pessoas que possuem vínculo com elas. É necessĂĄrio que todas entendam que a violĂȘncia pode ser progressiva e cada vez mais letal. E, por isso, devem buscar auxílio para o problema que estĂĄ dentro de casa, tornando visível para o Estado um fato que apenas quem estĂĄ na relação tem conhecimento", observa a delegada.
Os familiares também são importantes nesse processo de rompimento do ciclo da violĂȘncia e tem o dever moral de auxiliar a vítima, buscando o aparato estatal.
"O aplicativo SOS Mulher MT é uma tecnologia muito avançada em prol da mulher, possibilitando que ela acione a Segurança Pública onde quer que esteja, com o simples clicar de um botão. Temos também a Patrulha Maria da Penha em muitas cidades, com acompanhamento da efetividade das medidas protetivas pela Polícia Militar", pontua Mariell.