A certificação e reconhecimento foram comemorados pelas 50 famílias que vivem na comunidade, distante pouco mais que 100 quilômetros de Palmas, capital do estado.
"Quando uma criança nasce, não tem como negar que ela nasceu. A gente sempre existe, mas agora a gente tem uma certificação dizendo que a gente existe. É como se fosse uma certidão de nascimento", disse a presidente da Associação da Comunidade Rio Preto, Rita Lopes.O reconhecimento da comunidade permitirá o avanço no processo de demarcação do território tradicional quilombola pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e poderá dar fim às disputas judiciais e tensão existentes na região, desde 2015, quando empresas e ruralistas passaram a reivindicar parte das terras tradicionais.
Em setembro, a Justiça Federal reconheceu o direito das famílias da comunidade e determinou a reintegração de posse das terras, que antes haviam sido julgadas a favor de fazendeiros pela Justiça de Tocantins. Desde então, as ameaças de fazendeiros foram intensificadas.
"No papel, a gente conseguiu avançar, mas a pressão aumentou e aos poucos estamos sendo expulsos do nosso lugar. Há algumas semanas dispararam tiros contra a gente, três casas foram queimadas e uma foi derrubada por um trator. Muitos deixaram suas casas por medo e só conseguem chegar nelas escondidos durante a noite, para limpar e buscar alguma coisa", contou Rita.
Segundo integrantes da comunidade, os atos violentos teriam partido dos mesmos autores de processos judiciais. "Eles não se intimidam e a violência fez com que impossibilitem o acesso a nossos diretos. Fecharam a casa de arroz, fecharam a casa de farinha e, por último, fecharam uma escola", disse Rita.
A certificação também garante o acesso dos integrantes da comunidade quilombola às políticas públicas destinadas a essa população. Após a demarcação, a manutenção das culturas e tradições será ainda mais assegurada.
Recentemente, a Fundação Cultural Palmares criou uma ferramenta de proteção territorial quilombola, por meio de um canal de denúncia de invasões, perturbações ou ameaça, disponível no site do órgão. Associada à ferramenta, a fundação idealizou cartilhas com instruções sobre como denunciar e com informações sobre os direitos dos povos tradicionais de matriz africana.
A certificação é concedida aos "grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida", conforme prevê o decreto 4.887/2003.
O processo é feito por meio de um requerimento disponível no site da FCP, que deve ser cadastrado junto com a ata da reunião ou assembleia que tratou da autodeclaração entre os integrantes da comunidade; a lista de assinatura dos participantes; e um relato sobre a história do grupo.